Resenha cultural: Speed Racer

(...) Um filme muito bom, porque sabe não se levar a sério demais. Equilibra muito bem drama, comédia, cenas hiperbólicas de corrida, romance e emoção. Por Raquel Gandra (*), da redação.

Speed Racer é um filme dos Irmãos Wachowski. Saber disso poderia ser irrelevante, mas nesse caso não é. A estética, o ritmo e os efeitos são claramente produtos das mesmas mentes criativas que inventaram Matrix.

O visual é uma mistura de desenho japonês, Andy Warhol e um gigante caleidoscópio. Muitas cores vivas e cenários surreais ajudam a criar uma outra realidade. Tal realidade é tão distinta da nossa ou de qualquer outra vista no cinema, que facilita a credibilidade e a crença na história e nos personagens que ali se desenvolvem.

A decupagem dos planos é visivelmente baseada no desenho que deu origem: muitos planos próximos, transições de cenas e de situações em que a câmera gira em torno do personagem ou simplesmente este passa de um lado para o outro da imagem enquanto um panorama do momento é narrado. O timing é bastante similar ao dos desenhos japoneses antigos, com drama e cenas de luta intercaladas por comédia.

A forma de atuar mantém os padrões meio exagerados e previamente estabelecidos. O figurino, os penteados, a maquiagem e até mesmo os ícones midiáticos, como o desenho que o filho mais novo assiste junto ao seu macaco, TUDO tenta se aproximar ao máximo da própria forma dos personagens daquela época.

Os vilões são bem caricaturais, marcados por elementos típicos desse tipo de personagem presentes nas histórias dos anos 60. Gângsters mafiosos com suas metralhadoras, tommy guns, cicatrizes, sorrisos tortos, reações extremadas, etc.

Um dos maiores trunfos do filme é conseguir manter a ingenuidade do personagem e a leveza da história. O romance é bem desenvolvido sem muitas “frescuras” que filmes de heróis costumam ter, as cenas de beijos são constantemente interrompidas por elementos cômicos, assim como as de violência, os corredores que são jogados para fora da pista aparecem protegidos por um sistema que produz espumas por todo o veículo, os vilões, como já foi dito, são fáceis de se identificar, o que nos leva a concluir que é, sim, um desses filmes em que o mau é mau e o bom é bom, totalmente coerente com a linguagem usada.

As cenas de luta são mais uma peculiaridade que vai de acordo com o ritmo que já mencionei, balanceadas com momentos cômicos e golpes que vão desde os geniais aos mais fortuitos e improváveis. Uma seqüência inesquecível é a dos Ninjas incompetentes. Já as cenas das corridas são emocionantes e absurdas, com direito a frases de efeito de um Speed mais forte e determinado já pra meados do filme.

As falcatruas dos carros, as linhas de movimentos que dão noção de velocidade durante as corridas, as paisagens naturais inusitadas pelas quais os carros passam, os caminhos “tortuosos”, as comemorações entusiasmadas, dentre outros elementos, são todos perfeitamente compatíveis com as do anime criado nos anos 60 por Tatsuo Yoshida.

A trilha sonora tem a presença constante da música tema de Speed Racer “Mahha Go! Go!! Go!!!”, ou pelo menos, extratos da mesma espalhadas pela narrativa.

Apesar de todos os elementos cômicos, há também um drama genuíno.

Os atores ajudam a dar veracidade e sentimento à família Racer, desde a bela cena de sua mãe, Susan Sarandon, dizendo que o que ele faz é arte e não apenas um esporte, até o seu pai, John Goodman, redescobrindo a alegria de viver através de uma noite de nostalgia com Speed ainda pequeno assistindo a uma velha corrida. Christina Ricci está formidável e idêntica a Prixie, com seus grandes olhos expressivos e sorriso encantador. Até mesmo o menininho, irmão mais novo, interpretado por Paulie Litt está muito bem como o personagem mais engraçado que se mete em confusões com seu chimpanzé “de estimação”.

Matthew Fox está bem diferente de seu papel em ‘Lost’ e talvez por isso e por ter poucos momentos no filme em que mostra seu rosto inteiramente, tenha tido espaço para mostrar uma boa atuação, conseguindo se distanciar desse recente personagem estigmatizado. Sua voz, na verdade, é o que dá mais força e caráter a seu personagem.

A linguagem narrativa é, para minha surpresa, rebuscada, com flashbacks mal explicados em que o espectador tem que prestar atenção para entender e reviravoltas não esperadas.

Para os mais fãs, há seqüências memoráveis. Desde a saída de Speed do carro exatamente igual à cena final da abertura do desenho animado até o hiper rali que segue o mesmo espírito da animação, atravessando climas e paisagens completamente diferentes, passando por dentro de montanhas, etc. Apesar de haver algumas modificações, como as pistas que parecem mais montanhas russa; os elementos todos do original estão lá, desde os já mencionados, até locutores super entusiasmados e pequenos detalhes como os closes nas ações dentro do carro ou as cenas das batidas.

Um filme muito bom, porque sabe não se levar a sério demais. Equilibra muito bem drama, comédia, cenas hiperbólicas de corrida, romance e emoção. E além de tudo ainda tem uma mensagem bonita. O que mais eu poderia querer?

(*) Raquel Gandra é repórter cultural da Revista Consciência.Net na área de cinema. Clique na imagem para ver o trailer.



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