Em 21 de agosto de 1940, quando Trotsky morria assassinado, o movimento que organizara pela revolução mundial e contra a burocracia stalinista bordejava o imenso buraco negro que seus opositores lhe haviam aberto. Durante a Segunda Guerra e nos anos que a sucederam, as já desmilingüidas fileiras da apenas-fundada 4ª Internacional foram quase varridas da Europa pela repressão burguesa e stalinista.
A contribuição da população soviética e do operariado comunista europeu na vitória sobre o fascismo cobriram de prestígio a direção stalinista. Em março de 1953, quando Stálin morreu, as forças contra as quais Trotsky combatera viviam verdadeiro apogeu. Multidões de populares desfilaram diante do corpo do “Pai dos Povos” enquanto jorravam elogios mundiais de acólitos. As direções stalinistas dirigiam a URSS, a China, o Leste Europeu e milhões de trabalhadores no coração e na periferia do capitalismo.
Nesse então, os poucos milhares de militantes trotskistas que continuavam denunciando políticas que apontavam como suicidarias para os trabalhadores seguiriam sendo caluniados, reprimidos, assassinados. A construção de movimento revolucionário em momento de expansão do capitalismo, sem raízes orgânicas com o grande operariado, sob o tacão do prestígio stalinista, sem dirigentes fogueados nos confrontos da primeira metade do século mostrava-se missão quase impossível.
O humilde túmulo com a foice, o martelo e o nome Trotsky, no jardim da pequena morada transformada em bunker na periferia da capital mexicana, era metáfora da agonia que vivia uma memória e um ideário que nas décadas seguintes interessariam talvez apenas a historiadores. Uma pregação que parecia destinada ao culto de grupinhos de sectários atraídos pelo calor decrescente obtido na adoração passiva de ideal que refulgira no passado.
O Homem Põe, a História Dispõe
Às portas dos setenta anos da morte de Trotsky, a história arranjou-se para que seu ideário galvanize centenas de milhares de ativistas sociais, jovens e adultos, estudantes, intelectuais e trabalhadores, enquanto que o representante das práticas que combateu, desacredito, encontre apenas raros defensores oblíquos, disfarçados e envergonhados. Singular inversão que se materializou em menos de três dramáticas décadas. Na França, as organizações trotskistas já superam o antigo poderoso PCF, sob o perigo da extinção. Em 2007, seu candidato à presidência obteve 1,93% dos votos. Na Itália, militantes inspirados no ideário de Trotsky defendem em crescente número e destaque a herança liquidada por um PCI transformado em braço do capitalismo e imperialismo.
Em artigo recente, “Apontamentos sobre Trotsky – O mito e a realidade”, Miguel Urbano Rodrigues registra a perplexidade da geração de comunistas educada sob a pesada sombra do PC Russo diante da incrivelmente “tenaz sobrevivência [...] do nome e de algumas teses” de Trotsky “no debate de idéias contemporâneo”. Miguel Urbano é velho e brilhante intelectual do pequeno e combativo Partido Comunista Português que, com reais vínculos com a diminuta classe operária lusitana, resistiu com brio à degringolada colaboracionista eurocomunista, sem realizar entretanto a catarse de heranças e práticas que contribuem para mantê-lo no isolamento relativo. Fundado em 1921, nas eleições legislativas de 2005, o PCP obteve 7,60% dos sufrágios.
O ensaio de Miguel Urbano de explicação do crescente prestígio de Trotsky e multiplicação de seus seguidores repete a tradicional pragmática stalinista, apenas depurada das suas mais esdrúxulas excrescências. A apologia de Trotsky seria obra sobretudo de “intelectuais burgueses” interessados em “combater a URSS” e a “herança da Revolução de Outubro”. O combate que lhe deu o stalinismo contribuiria também a esse reconhecimento! Como pouco se lê, pouco se reedita, pouco se publica sobre Trotsky, seu prestígio seria simples mitificação, na qual incorreriam sobretudo trotskistas em sua “maioria” “pequeno-burgueses enraivecidos” que, logo “voltam a integrar-se no sistema após uma breve militância pseudo-revolucionária”.
Se a calúnia e a repressão aos trotskistas resultassem em difusão e apoio, a Rússia seria hoje a pátria da 4ª Internacional, tamanha a sanha stalinista contra a memória do construtor do Exército Vermelho e seus seguidores na antiga URSS! Apenas no Brasil, onde são escassas as edições marxistas, entre outras obras, foram recentemente reeditadas a biografia de Isaac Deutscher [Civilização Brasileira], a Revolução permanente [Expressão Popular], a História da revolução russa [Sandermann], Literatura & Revolução [Zahar]. Movimento editorial substancialmente ainda mais dinâmico em países como a França, Itália, Espanha, Alemanha, Argentina.
A afirmação de Miguel Urbano que sobre “o homem e a [sua] obra não foram nas últimas décadas publicados livros importantes que acrescentem algo de significante aos produzidos pelos seus biógrafos, nomeadamente a trilogia do historiador” Isaac Deutscher” [1907-1967], deve-se à ignorância do jornalista que, sintomaticamente, constrói seu artigo sobretudo apoiado na obra do historiador polonês, dos anos 1950-60, sem qualquer referência à monumental biografia do historiador marxista Pierre Broué [1926-2005], de 1988, autor igualmente de, entre outros, Communistes contre Staline : Massacre d'une génération, de 2003. Esta afirmação de Miguel Urbano, como a sobre a escassa reedição de obras de Trotsky, devem-se certamente a uma espécie de cegueira seletiva.
Pro Outro Lado da Trincheira
Não há dúvidas que nos últimos anos alguns militantes de destaque mudaram-se de mala e cuia para o outro lado da trincheira, após militâncias não tão breves em organizações trotskistas. Talvez o caso mais célebre seja o ex-primeiro ministro francês Lionel Jospain, antigo militante lambertista infiltrado no Partido Socialista. No Brasil temos também algumas dezenas de semelhantes trânsfugas, que pularam a cerca para se entregarem aos doces prazeres da gestão do poder, participando gostosamente nos governos neoliberais de Lula da Silva, com destaque para Antonio Palocci, ex-ministro da Fazenda, e Luís Gushiken, também lambertistas.
Igual trajetória percorreu a imensa maioria dos dirigentes dos partidos comunistas burocratizados do Oriente e do Ocidente, que abandonou a trincheira momentos antes e sobretudo durante a maré contra-revolucionária vitoriosa dos anos 1980. Porém, nas filas stalinistas, a traição-deserção não foi fenômeno individual, mas movimento social de centenas de milhares de burocratas russos, ucranianos, poloneses, húngaros, iugoslavos, chineses, etc., que participaram ativamente do processo de restauração capitalistas e canibalização das riquezas sociais, passando a constituir um dos eixos centrais da nova classe proprietária.
Nos partidos comunistas ocidentais não foi diferente. Apenas um exemplo excelente. Massimo D’Alema, o jovem ex-dirigente do PCI, participou à cabeça do governo italiano do ataque militar imperialista ao pouco que sobrava da antiga federação iugoslava. Hoje com pouco mais de oitenta anos, Miguel Urbano certamente conheceu e conviveu com boa parte dessa direção vira-casaca, à qual negou-se a seguir, perseverando em seus compromissos.
Sempre segundo o articulista, o prestígio de Trotsky deveria-se sobretudo à mitificação sobre seu papel na Revolução Russa empreendida por ele mesmo e por autores e historiadores sobretudo trotskistas. “Duas obras do próprio Trotsky e a trilogia de Deutscher [...] funcionaram também como estímulos na fabricação do mito.” Para comprovar sua tese, dedica a maior parte de seu artigo à demonstração de que Trotsky e Lênin divergiram fortemente antes de 1917 e diversas vezes após a Revolução, com destaque para a Paz de Brest-Litovski e as polêmicas sobre os sindicatos e a Gosplan [Comitê Estatal de Planejamento].
Para o jornalista português, seria igualmente despropositada não apenas naquela literatura a apresentação de Lênin e Trotsky como os dois principais dirigentes revolucionários russos. “[...] a tentativa dos seus epígonos e de historiadores burgueses de o guindar a ‘companheiro de Lênin’, colocando-o ao nível do líder da Revolução, falseia grosseiramente a história.” Miguel Urbano denuncia portanto a “idealização de Trotsky” [revolucionário de segunda linha, em relação a Lênin], definindo-o, direta ou indiretamente, como homem “vaidoso”, “arrogante”, “orgulhoso”, “autoritário” e, segundo Lênin, “canalha”, “oportunista” e “conciliador”.
Miguel Urbano impugna a “mitificação” de Trotsky e denuncia a “diabolização” de Stálin, para ele, dirigente revolucionário de alto coturno, ao qual literalmente canoniza: “[...] revolucionário cuja contribuição para a transição do capitalismo para o socialismo na União Soviética foi decisiva. Sem a sua ação à frente do Partido e do Estado, a URSS não teria sobrevivido à agressão bárbara do Reich nazi, sem ela a pátria de Lênin não se teria transformado em poucas décadas na segunda potencia mundial, impulsionando um internacionalismo que apressou a descolonização, incentivou e defendeu revoluções no Terceiro Mundo e estimulou poderosamente a luta dos trabalhadores nos países desenvolvidos do Ocidente.”
História e Luta de Classes
A compreensão das razões pelas quais o espólio de Trotsky segue galvanizando os que combatem a opressão capitalista não se encontra no exame pontilhista de sua trajetória antes e durante a Revolução Russa, tendo como o padrão referencial absoluto um Lênin idealizado e mitificado. Lênin e Trotsky, os dois maiores dirigentes daqueles embates, divergiram forte e duramente em muitíssimas ocasiões, com destaque para os anos anteriores à Revolução. As desqualificações que voaram de um lado ao outro, entre os dois, e dos dois com boa parte dos dirigentes políticos de então, registram a dureza da discussão e vertente cultural não muito sadia da época. O prosseguimento da história terminou comprovando quem tinha razão e quem se enganara nos diversos embates e que o denominador comum entre ambos foi sempre a luta intransigente em defesa dos oprimidos.
Lênin destacou-se como o principal teórico do partido revolucionário, destacamento político e orgânico das classes trabalhadoras, em geral, e de seus segmentos industriais avançados, em especial, construído para o assalto ao poder burguês e consolidação da ordem socialista. Sua contribuição sobre o centralismo democrático e a ditadura do proletariado são fundamentais à sociologia revolucionária. Lênin foi sempre sobretudo homem de partido e de organização. A sua compreensão tardia de que apenas a revolução socialista consolidaria as conquistas democráticas na Rússia tzarista ensejou que boa parte de sua publicística anterior a 1917 seja de difícil leitura e compreensão, exigindo comumente uma complexa contextualização histórica.
A história demonstrou que Trotsky não avaliou corretamente a importância do partido no assalto ao poder. Sua convergência com os bolcheviques constituiu também autocrítica nesse relativo. A seguir, abraçaria explicitamente as contribuições de Lênin quanto à organização partidária. Sua incompreensão parece ter nascido igualmente da forma de entender a sociedade. Na sua ação e interpretação dos fenômenos sociais, enfatizou sempre o movimento das massas trabalhadoras. Para ele, a revolução foi sempre processo de construção das condições objetivas e subjetivos de poder no seio das massas exploradas. Visão que contribuiu poderosamente para sua definição precoce e pioneira do caráter socialista da revolução russa.
Na mais pura tradição marxiana, Trotsky não via saúde social e política fora da materialidade das classes trabalhadoras em movimento. A visão leninista da revolução abraçava esse princípio, sem a mesma ênfase e a mesma sensibilidade. Porém, se a visão leninista da revolução enfatizava a organização partidária, a própria esquerda stalinista obliterou fortemente o caráter determinante do movimento vivo dos trabalhadores e a necessidade de sua expressão plena nos aparatos partidários e jamais substituição pelos mesmos. Na interpretação de Miguel Urbano não há aceno aos fluxos e refluxos da revolução mundial no século 20, que enquadraram-determinaram os fatos que analisa.
O Princípio e o Fim
Olvidando o movimento vivo das classes como o alfa & ômega da história, Miguel Urbano eleva Lênin – e com ele o partido – à figura de perfeição lapidar, transformando-o em verdadeiro deus ex-machina da história. Para ele, Vladimir Ulich era “genial”, “excepcional”, “habilidoso”, a tal ponto possuidor das qualidades revolucionárias que seria impossível pensar a unidade partidária sem ele. “Essa unidade na ação e no pensamento, mesmo entre os membros da velha guarda bolchevique, desapareceu quando Lênin morreu. Sem ele, era impossível.” Proposta de inexorável divisão dos bolcheviques, pois Lênin, ser humano, cedo ou tarde, morreria. Substituição dos trabalhadores na construção da história, por protagonistas magníficos, registrada já na proposta de que sem Stálin a “URSS não teria sobrevivido à agressão” nazista e se transformado “em poucas décadas na segunda potencia mundial”.
Trotsky foi dirigente revolucionário de destaque, como Lênin, sendo até a conclusão da revolução de 1917 mais conhecido do que o último no exterior. Não foi por azares da sorte que presidiu o soviet de Petrogrado, na Revolução de 1905 e de 1917. Apesar dos ataques incessantes stalinistas, sua posição referencial deve-se também a outros fenômenos, entre eles, à sua indiscutível habilidade como teórico, orador e escritor, que lhe permitiu socializar maciçamente, sob a forma de obras teóricas e históricas magistrais, a memória da Revolução Russa. A excelência de seu 1905: balanço e perspectivas, escrito inicialmente em 1906, quando tinha 26 anos, registrava já as qualidades que lhe permitiram produzir trabalhos da dimensão de A história da Revolução Russa [1930-32], obra referencial sobre 1917, na tradição das monumentais histórias da Revolução Francesa de Jules Michelet [1798-1874] e Kropotkine [1842-1921]. Devido a sua morte prematura e características individuais, Lênin não deixou obras semelhante, capazes de serem lidas à margem de esforço militante ou acadêmico.
A atualidade de León Trotsky deveu-se sobretudo à sua compreensão precoce dos perigos e das raízes sociais da burocracia na URSS, vetor da expropriação da direção política da URSS aos trabalhadores. Realidade intuída tardiamente por Lênin, nos meses e semanas anteriores ao seu falecimento. A carta de Lênin de dezembro de 1922 é incorretamente apresentada como “testamento”, pois ele jamais deixou documento de tal caráter, ao possivelmente não acreditar-se tão próximo do fim. Seu rompimento final com Stálin deu-se devido ao modo inaceitável com que tratara Natália Krupskaya [1869-1939], importante dirigente bolchevique e sua esposa. Lênin possivelmente acreditava que continuaria ainda por algum tempo arbitrando as fricções no partido, das quais não avaliou plenamente a gravidade e o sentido social.
Grande parte da produção teórica de Trotsky deu-se no contexto do combate à burocratização da URSS, nos momentos e sobretudo após a morte de Lênin. É dolorosa a leitura atual do ensaio Novo Curso, de 1923, devido à sua extrema lucidez sobre as raízes e os malefícios da perda da direção da URSS pelo proletariado, deslocado pelo aparato burocrático. Fenômeno que passou a exigir revolução política que devolvesse o poder aos trabalhadores em Estado em que a propriedade já fora expropriada. Um ensaio que ampliava a visão de Lênin do partido, ao reafirmar que sua essência dependia da capacidade de organizar e expressar as grandes massas trabalhadoras em geral e o moderno proletariado industrial em especial. Entre outros trabalhos, a crítica de Trotsky à burocratização da URSS foi ampliada em A revolução traída, de 1935, reeditada em português, em 2008, pela Centauro, que acaba de publicar igualmente A revolução desfigurada.
A Cola da Burguesia
A longa pregação sobre a necessária revolução social no Ocidente e política no Oriente constitui certamente a grande razão do crescente renascimento do interesse sobre Trotsky, quando da dolorosa concretização de seus terríveis prognósticos sobre a destruição dos Estados de economia nacionalizada e planejada, enfraquecidos pela ditadura de burocracias parasitárias. Devido à atualidade desse ideário, a burocracia soviética da era Gorbachiov reabilitou praticamente todos os bolcheviques perseguidos e assassinados pela direção stalinista, à exceção de León Trotsky e seus mais próximos seguidores, pois seguiam apontando para a necessidade da devolução plena do poder aos órgãos soviéticos, como única forma de barrar o caminho à vitória da contra-revolução e ao restabelecimento do capitalismo.
Uma terceira grande razão da atualidade de Trotsky foi sua mobilização permanente pela independência do mundo operário; sua denúncia da submissão dos trabalhadores aos setores ditos progressistas da burguesia [frente popular]; sua oposição visceral à proposta de superação gradual da ordem burguesa sem a destruição de seu Estado. Políticas transformadas em práticas oficiais dos partidos comunistas, devido às necessidades diplomáticas egoístas e imediatistas da direção soviética burocratizada. Propostas que ensejaram derrotas históricas ao movimento revolucionário na Alemanha, França, Espanha, Itália, Brasil, etc. e, nas últimas décadas, a dissolução e metamorfose dos partidos comunistas em agentes do grande capital e do imperialismo. Uma pregação e um ideário plenamente vigentes nos atuais e difíceis dias que vivemos.
A recuperação do stalinismo e de Stálin realizada por Miguel Urbano sequer necessita resposta. O literal massacre físico de praticamente toda a geração bolchevique dirigente de 1917, com destaque para o Comitê Central de Lênin; o descrédito em que lançou a idéia do socialismo e do comunismo; o descalabro a que a URSS foi exposta, no início da II Guerra, pela purga de dezenas de milhares oficiais soviéticos e confiança depositada na paz pactuada o nazismo; os malefícios da coletivização forçada dos campos; a traição à revolução espanhola, balcânica, européia, etc.; a redução do movimento comunista a simples cola das burguesias ditas democráticas; a expropriação do poder aos trabalhadores nos países operários, etc. foram políticas que levaram à destruição das conquistas de 1917, quando o dinamismo da nacionalização e planejamento da produção não conseguiu mais se sobrepor ao peso do parasitismo nacional-burocrático, como já sugerira Trotsky desde 1923!
O trotskismo constitui apenas a última extensão orgânica por um grande teórico e dirigente revolucionário dos ensinamentos acumulado na primeira metade do século 20. Nesse sentido, o ideário de León Trotsky constitui essencialmente uma valiosa ampliação das idéias e lutas de Marx, Engels, Rosa Luxemburgo, Karl Liebknecht, Lênin, Gramsci, etc., em uma nova e difícil conjuntura histórica. Sobretudo com a crise e dissolução das propostas políticas stalinistas, maoístas, titoístas, foquistas, torna-se de certo modo desnecessário o qualificativo trotskista, inventado originalmente pelos stalinistas, ao constituir um certo entrave à necessária reunificação dos comunistas revolucionários em um movimento mundial pela reconstrução da sociedade centrada nos valores, práticas e ações revolucionárias e democráticas do mundo do trabalho.
A contribuição da população soviética e do operariado comunista europeu na vitória sobre o fascismo cobriram de prestígio a direção stalinista. Em março de 1953, quando Stálin morreu, as forças contra as quais Trotsky combatera viviam verdadeiro apogeu. Multidões de populares desfilaram diante do corpo do “Pai dos Povos” enquanto jorravam elogios mundiais de acólitos. As direções stalinistas dirigiam a URSS, a China, o Leste Europeu e milhões de trabalhadores no coração e na periferia do capitalismo.
Nesse então, os poucos milhares de militantes trotskistas que continuavam denunciando políticas que apontavam como suicidarias para os trabalhadores seguiriam sendo caluniados, reprimidos, assassinados. A construção de movimento revolucionário em momento de expansão do capitalismo, sem raízes orgânicas com o grande operariado, sob o tacão do prestígio stalinista, sem dirigentes fogueados nos confrontos da primeira metade do século mostrava-se missão quase impossível.
O humilde túmulo com a foice, o martelo e o nome Trotsky, no jardim da pequena morada transformada em bunker na periferia da capital mexicana, era metáfora da agonia que vivia uma memória e um ideário que nas décadas seguintes interessariam talvez apenas a historiadores. Uma pregação que parecia destinada ao culto de grupinhos de sectários atraídos pelo calor decrescente obtido na adoração passiva de ideal que refulgira no passado.
O Homem Põe, a História Dispõe
Às portas dos setenta anos da morte de Trotsky, a história arranjou-se para que seu ideário galvanize centenas de milhares de ativistas sociais, jovens e adultos, estudantes, intelectuais e trabalhadores, enquanto que o representante das práticas que combateu, desacredito, encontre apenas raros defensores oblíquos, disfarçados e envergonhados. Singular inversão que se materializou em menos de três dramáticas décadas. Na França, as organizações trotskistas já superam o antigo poderoso PCF, sob o perigo da extinção. Em 2007, seu candidato à presidência obteve 1,93% dos votos. Na Itália, militantes inspirados no ideário de Trotsky defendem em crescente número e destaque a herança liquidada por um PCI transformado em braço do capitalismo e imperialismo.
Em artigo recente, “Apontamentos sobre Trotsky – O mito e a realidade”, Miguel Urbano Rodrigues registra a perplexidade da geração de comunistas educada sob a pesada sombra do PC Russo diante da incrivelmente “tenaz sobrevivência [...] do nome e de algumas teses” de Trotsky “no debate de idéias contemporâneo”. Miguel Urbano é velho e brilhante intelectual do pequeno e combativo Partido Comunista Português que, com reais vínculos com a diminuta classe operária lusitana, resistiu com brio à degringolada colaboracionista eurocomunista, sem realizar entretanto a catarse de heranças e práticas que contribuem para mantê-lo no isolamento relativo. Fundado em 1921, nas eleições legislativas de 2005, o PCP obteve 7,60% dos sufrágios.
O ensaio de Miguel Urbano de explicação do crescente prestígio de Trotsky e multiplicação de seus seguidores repete a tradicional pragmática stalinista, apenas depurada das suas mais esdrúxulas excrescências. A apologia de Trotsky seria obra sobretudo de “intelectuais burgueses” interessados em “combater a URSS” e a “herança da Revolução de Outubro”. O combate que lhe deu o stalinismo contribuiria também a esse reconhecimento! Como pouco se lê, pouco se reedita, pouco se publica sobre Trotsky, seu prestígio seria simples mitificação, na qual incorreriam sobretudo trotskistas em sua “maioria” “pequeno-burgueses enraivecidos” que, logo “voltam a integrar-se no sistema após uma breve militância pseudo-revolucionária”.
Se a calúnia e a repressão aos trotskistas resultassem em difusão e apoio, a Rússia seria hoje a pátria da 4ª Internacional, tamanha a sanha stalinista contra a memória do construtor do Exército Vermelho e seus seguidores na antiga URSS! Apenas no Brasil, onde são escassas as edições marxistas, entre outras obras, foram recentemente reeditadas a biografia de Isaac Deutscher [Civilização Brasileira], a Revolução permanente [Expressão Popular], a História da revolução russa [Sandermann], Literatura & Revolução [Zahar]. Movimento editorial substancialmente ainda mais dinâmico em países como a França, Itália, Espanha, Alemanha, Argentina.
A afirmação de Miguel Urbano que sobre “o homem e a [sua] obra não foram nas últimas décadas publicados livros importantes que acrescentem algo de significante aos produzidos pelos seus biógrafos, nomeadamente a trilogia do historiador” Isaac Deutscher” [1907-1967], deve-se à ignorância do jornalista que, sintomaticamente, constrói seu artigo sobretudo apoiado na obra do historiador polonês, dos anos 1950-60, sem qualquer referência à monumental biografia do historiador marxista Pierre Broué [1926-2005], de 1988, autor igualmente de, entre outros, Communistes contre Staline : Massacre d'une génération, de 2003. Esta afirmação de Miguel Urbano, como a sobre a escassa reedição de obras de Trotsky, devem-se certamente a uma espécie de cegueira seletiva.
Pro Outro Lado da Trincheira
Não há dúvidas que nos últimos anos alguns militantes de destaque mudaram-se de mala e cuia para o outro lado da trincheira, após militâncias não tão breves em organizações trotskistas. Talvez o caso mais célebre seja o ex-primeiro ministro francês Lionel Jospain, antigo militante lambertista infiltrado no Partido Socialista. No Brasil temos também algumas dezenas de semelhantes trânsfugas, que pularam a cerca para se entregarem aos doces prazeres da gestão do poder, participando gostosamente nos governos neoliberais de Lula da Silva, com destaque para Antonio Palocci, ex-ministro da Fazenda, e Luís Gushiken, também lambertistas.
Igual trajetória percorreu a imensa maioria dos dirigentes dos partidos comunistas burocratizados do Oriente e do Ocidente, que abandonou a trincheira momentos antes e sobretudo durante a maré contra-revolucionária vitoriosa dos anos 1980. Porém, nas filas stalinistas, a traição-deserção não foi fenômeno individual, mas movimento social de centenas de milhares de burocratas russos, ucranianos, poloneses, húngaros, iugoslavos, chineses, etc., que participaram ativamente do processo de restauração capitalistas e canibalização das riquezas sociais, passando a constituir um dos eixos centrais da nova classe proprietária.
Nos partidos comunistas ocidentais não foi diferente. Apenas um exemplo excelente. Massimo D’Alema, o jovem ex-dirigente do PCI, participou à cabeça do governo italiano do ataque militar imperialista ao pouco que sobrava da antiga federação iugoslava. Hoje com pouco mais de oitenta anos, Miguel Urbano certamente conheceu e conviveu com boa parte dessa direção vira-casaca, à qual negou-se a seguir, perseverando em seus compromissos.
Sempre segundo o articulista, o prestígio de Trotsky deveria-se sobretudo à mitificação sobre seu papel na Revolução Russa empreendida por ele mesmo e por autores e historiadores sobretudo trotskistas. “Duas obras do próprio Trotsky e a trilogia de Deutscher [...] funcionaram também como estímulos na fabricação do mito.” Para comprovar sua tese, dedica a maior parte de seu artigo à demonstração de que Trotsky e Lênin divergiram fortemente antes de 1917 e diversas vezes após a Revolução, com destaque para a Paz de Brest-Litovski e as polêmicas sobre os sindicatos e a Gosplan [Comitê Estatal de Planejamento].
Para o jornalista português, seria igualmente despropositada não apenas naquela literatura a apresentação de Lênin e Trotsky como os dois principais dirigentes revolucionários russos. “[...] a tentativa dos seus epígonos e de historiadores burgueses de o guindar a ‘companheiro de Lênin’, colocando-o ao nível do líder da Revolução, falseia grosseiramente a história.” Miguel Urbano denuncia portanto a “idealização de Trotsky” [revolucionário de segunda linha, em relação a Lênin], definindo-o, direta ou indiretamente, como homem “vaidoso”, “arrogante”, “orgulhoso”, “autoritário” e, segundo Lênin, “canalha”, “oportunista” e “conciliador”.
Miguel Urbano impugna a “mitificação” de Trotsky e denuncia a “diabolização” de Stálin, para ele, dirigente revolucionário de alto coturno, ao qual literalmente canoniza: “[...] revolucionário cuja contribuição para a transição do capitalismo para o socialismo na União Soviética foi decisiva. Sem a sua ação à frente do Partido e do Estado, a URSS não teria sobrevivido à agressão bárbara do Reich nazi, sem ela a pátria de Lênin não se teria transformado em poucas décadas na segunda potencia mundial, impulsionando um internacionalismo que apressou a descolonização, incentivou e defendeu revoluções no Terceiro Mundo e estimulou poderosamente a luta dos trabalhadores nos países desenvolvidos do Ocidente.”
História e Luta de Classes
A compreensão das razões pelas quais o espólio de Trotsky segue galvanizando os que combatem a opressão capitalista não se encontra no exame pontilhista de sua trajetória antes e durante a Revolução Russa, tendo como o padrão referencial absoluto um Lênin idealizado e mitificado. Lênin e Trotsky, os dois maiores dirigentes daqueles embates, divergiram forte e duramente em muitíssimas ocasiões, com destaque para os anos anteriores à Revolução. As desqualificações que voaram de um lado ao outro, entre os dois, e dos dois com boa parte dos dirigentes políticos de então, registram a dureza da discussão e vertente cultural não muito sadia da época. O prosseguimento da história terminou comprovando quem tinha razão e quem se enganara nos diversos embates e que o denominador comum entre ambos foi sempre a luta intransigente em defesa dos oprimidos.
Lênin destacou-se como o principal teórico do partido revolucionário, destacamento político e orgânico das classes trabalhadoras, em geral, e de seus segmentos industriais avançados, em especial, construído para o assalto ao poder burguês e consolidação da ordem socialista. Sua contribuição sobre o centralismo democrático e a ditadura do proletariado são fundamentais à sociologia revolucionária. Lênin foi sempre sobretudo homem de partido e de organização. A sua compreensão tardia de que apenas a revolução socialista consolidaria as conquistas democráticas na Rússia tzarista ensejou que boa parte de sua publicística anterior a 1917 seja de difícil leitura e compreensão, exigindo comumente uma complexa contextualização histórica.
A história demonstrou que Trotsky não avaliou corretamente a importância do partido no assalto ao poder. Sua convergência com os bolcheviques constituiu também autocrítica nesse relativo. A seguir, abraçaria explicitamente as contribuições de Lênin quanto à organização partidária. Sua incompreensão parece ter nascido igualmente da forma de entender a sociedade. Na sua ação e interpretação dos fenômenos sociais, enfatizou sempre o movimento das massas trabalhadoras. Para ele, a revolução foi sempre processo de construção das condições objetivas e subjetivos de poder no seio das massas exploradas. Visão que contribuiu poderosamente para sua definição precoce e pioneira do caráter socialista da revolução russa.
Na mais pura tradição marxiana, Trotsky não via saúde social e política fora da materialidade das classes trabalhadoras em movimento. A visão leninista da revolução abraçava esse princípio, sem a mesma ênfase e a mesma sensibilidade. Porém, se a visão leninista da revolução enfatizava a organização partidária, a própria esquerda stalinista obliterou fortemente o caráter determinante do movimento vivo dos trabalhadores e a necessidade de sua expressão plena nos aparatos partidários e jamais substituição pelos mesmos. Na interpretação de Miguel Urbano não há aceno aos fluxos e refluxos da revolução mundial no século 20, que enquadraram-determinaram os fatos que analisa.
O Princípio e o Fim
Olvidando o movimento vivo das classes como o alfa & ômega da história, Miguel Urbano eleva Lênin – e com ele o partido – à figura de perfeição lapidar, transformando-o em verdadeiro deus ex-machina da história. Para ele, Vladimir Ulich era “genial”, “excepcional”, “habilidoso”, a tal ponto possuidor das qualidades revolucionárias que seria impossível pensar a unidade partidária sem ele. “Essa unidade na ação e no pensamento, mesmo entre os membros da velha guarda bolchevique, desapareceu quando Lênin morreu. Sem ele, era impossível.” Proposta de inexorável divisão dos bolcheviques, pois Lênin, ser humano, cedo ou tarde, morreria. Substituição dos trabalhadores na construção da história, por protagonistas magníficos, registrada já na proposta de que sem Stálin a “URSS não teria sobrevivido à agressão” nazista e se transformado “em poucas décadas na segunda potencia mundial”.
Trotsky foi dirigente revolucionário de destaque, como Lênin, sendo até a conclusão da revolução de 1917 mais conhecido do que o último no exterior. Não foi por azares da sorte que presidiu o soviet de Petrogrado, na Revolução de 1905 e de 1917. Apesar dos ataques incessantes stalinistas, sua posição referencial deve-se também a outros fenômenos, entre eles, à sua indiscutível habilidade como teórico, orador e escritor, que lhe permitiu socializar maciçamente, sob a forma de obras teóricas e históricas magistrais, a memória da Revolução Russa. A excelência de seu 1905: balanço e perspectivas, escrito inicialmente em 1906, quando tinha 26 anos, registrava já as qualidades que lhe permitiram produzir trabalhos da dimensão de A história da Revolução Russa [1930-32], obra referencial sobre 1917, na tradição das monumentais histórias da Revolução Francesa de Jules Michelet [1798-1874] e Kropotkine [1842-1921]. Devido a sua morte prematura e características individuais, Lênin não deixou obras semelhante, capazes de serem lidas à margem de esforço militante ou acadêmico.
A atualidade de León Trotsky deveu-se sobretudo à sua compreensão precoce dos perigos e das raízes sociais da burocracia na URSS, vetor da expropriação da direção política da URSS aos trabalhadores. Realidade intuída tardiamente por Lênin, nos meses e semanas anteriores ao seu falecimento. A carta de Lênin de dezembro de 1922 é incorretamente apresentada como “testamento”, pois ele jamais deixou documento de tal caráter, ao possivelmente não acreditar-se tão próximo do fim. Seu rompimento final com Stálin deu-se devido ao modo inaceitável com que tratara Natália Krupskaya [1869-1939], importante dirigente bolchevique e sua esposa. Lênin possivelmente acreditava que continuaria ainda por algum tempo arbitrando as fricções no partido, das quais não avaliou plenamente a gravidade e o sentido social.
Grande parte da produção teórica de Trotsky deu-se no contexto do combate à burocratização da URSS, nos momentos e sobretudo após a morte de Lênin. É dolorosa a leitura atual do ensaio Novo Curso, de 1923, devido à sua extrema lucidez sobre as raízes e os malefícios da perda da direção da URSS pelo proletariado, deslocado pelo aparato burocrático. Fenômeno que passou a exigir revolução política que devolvesse o poder aos trabalhadores em Estado em que a propriedade já fora expropriada. Um ensaio que ampliava a visão de Lênin do partido, ao reafirmar que sua essência dependia da capacidade de organizar e expressar as grandes massas trabalhadoras em geral e o moderno proletariado industrial em especial. Entre outros trabalhos, a crítica de Trotsky à burocratização da URSS foi ampliada em A revolução traída, de 1935, reeditada em português, em 2008, pela Centauro, que acaba de publicar igualmente A revolução desfigurada.
A Cola da Burguesia
A longa pregação sobre a necessária revolução social no Ocidente e política no Oriente constitui certamente a grande razão do crescente renascimento do interesse sobre Trotsky, quando da dolorosa concretização de seus terríveis prognósticos sobre a destruição dos Estados de economia nacionalizada e planejada, enfraquecidos pela ditadura de burocracias parasitárias. Devido à atualidade desse ideário, a burocracia soviética da era Gorbachiov reabilitou praticamente todos os bolcheviques perseguidos e assassinados pela direção stalinista, à exceção de León Trotsky e seus mais próximos seguidores, pois seguiam apontando para a necessidade da devolução plena do poder aos órgãos soviéticos, como única forma de barrar o caminho à vitória da contra-revolução e ao restabelecimento do capitalismo.
Uma terceira grande razão da atualidade de Trotsky foi sua mobilização permanente pela independência do mundo operário; sua denúncia da submissão dos trabalhadores aos setores ditos progressistas da burguesia [frente popular]; sua oposição visceral à proposta de superação gradual da ordem burguesa sem a destruição de seu Estado. Políticas transformadas em práticas oficiais dos partidos comunistas, devido às necessidades diplomáticas egoístas e imediatistas da direção soviética burocratizada. Propostas que ensejaram derrotas históricas ao movimento revolucionário na Alemanha, França, Espanha, Itália, Brasil, etc. e, nas últimas décadas, a dissolução e metamorfose dos partidos comunistas em agentes do grande capital e do imperialismo. Uma pregação e um ideário plenamente vigentes nos atuais e difíceis dias que vivemos.
A recuperação do stalinismo e de Stálin realizada por Miguel Urbano sequer necessita resposta. O literal massacre físico de praticamente toda a geração bolchevique dirigente de 1917, com destaque para o Comitê Central de Lênin; o descrédito em que lançou a idéia do socialismo e do comunismo; o descalabro a que a URSS foi exposta, no início da II Guerra, pela purga de dezenas de milhares oficiais soviéticos e confiança depositada na paz pactuada o nazismo; os malefícios da coletivização forçada dos campos; a traição à revolução espanhola, balcânica, européia, etc.; a redução do movimento comunista a simples cola das burguesias ditas democráticas; a expropriação do poder aos trabalhadores nos países operários, etc. foram políticas que levaram à destruição das conquistas de 1917, quando o dinamismo da nacionalização e planejamento da produção não conseguiu mais se sobrepor ao peso do parasitismo nacional-burocrático, como já sugerira Trotsky desde 1923!
O trotskismo constitui apenas a última extensão orgânica por um grande teórico e dirigente revolucionário dos ensinamentos acumulado na primeira metade do século 20. Nesse sentido, o ideário de León Trotsky constitui essencialmente uma valiosa ampliação das idéias e lutas de Marx, Engels, Rosa Luxemburgo, Karl Liebknecht, Lênin, Gramsci, etc., em uma nova e difícil conjuntura histórica. Sobretudo com a crise e dissolução das propostas políticas stalinistas, maoístas, titoístas, foquistas, torna-se de certo modo desnecessário o qualificativo trotskista, inventado originalmente pelos stalinistas, ao constituir um certo entrave à necessária reunificação dos comunistas revolucionários em um movimento mundial pela reconstrução da sociedade centrada nos valores, práticas e ações revolucionárias e democráticas do mundo do trabalho.
(*) Mário Maestri, 60, é historiador. E-mail: maestri@via-rs.net
RODRIGUES, Miguel Urbano. “Apontamentos sobre Trotsky – O mito e a realidade”. 11/2008. http://resistir.info/mur/apontamentos_trotsky.html
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