Celso Lungaretti
"Marinheiro, marinheiro
Quero ver você no mar
Eu também sou marinheiro
Eu também sei governar"
("Arueira", Geraldo Vandré)
Depois de desenvolver uma odiosa perseguição ao ex-militante revolucionário e hoje escritor Cesare Battisti através de dois continentes e pressionar intensamente o governo brasileiro para que o extraditasse, o Governo Berlusconi reagiu com extrema arrogância à decisão do ministro da Justiça Tarso Genro, de lhe conceder refúgio humanitário.
Ao divulgar nota pedindo que o presidente Luiz Inácio Lula da Silva "reconsidere" a deliberação de Tarso, o Ministério de Relações Exteriores da Itália incidiu em três pecados capitais ao mesmo tempo:
* contestou uma decisão soberana do governo brasileiro;
* atingiu a autoridade do ministro Tarso Genro, já que passou por cima dele e foi diretamente a Lula para mudar sua decisão, quando o certo seria primeiramente apelar ao titular da Justiça para que reconsiderasse;
* atropelou o protocolo, já que a interlocutora da chancelaria italiana é sua congênere brasileira, enquanto o interlocutor de Lula é o presidente Silvio Berlusconi.
A nota italiana também reclama de haver Genro contrariado a avaliação do Comitê Nacional dos Refugiados, omitindo que foi uma votação dividida (3x2), bem de acordo com a existência de muitas dúvidas envolvendo o caso; e que o ministro da Justiça não é obrigado a seguir o parecer do Conare (órgão consultivo), nem pode ser recriminado por haver decidido de acordo com sua própria convicção, como tinha pleno direito de fazer.
É risível a alegação de que trancafiar o combalido e inofensivo Cesare Battisti numa masmorra seja imprescindível para "promover, no quadro da cooperação judiciária internacional, a luta contra o terrorismo". Trata-se de retórica vazia e alarmista que ofende a inteligência dos brasileiros -- aliás desconsiderada de forma contumaz pelos italianos. Salta aos olhos que Battisti não é nem nunca será Bin-Laden.
Quanto à convocação do embaixador brasileiro na Itália Adhemar Gabriel Bahadian para ouvir um pito do secretário-geral da chancelaria italiana Giampiero Massolo, pode até ser relevada como mero jogo-de-cena na linha do jus esperneandi (direito de espernear).
Mas, o Brasil não pode aceitar passivamente uma das frases da nota italiana relatando o que se passou nesse encontro: "A decisão do governo brasileiro de não conceder a extradição de Battisti é um fato desconcertante, ofensivo e de extrema gravidade".
Ofensiva não é a posição consistente e legítima que o governo brasileiro adotou, mas sim a insistência italiana em impor sua vontade a um país soberano.
Cabe ao Governo Lula colocar as coisas no seu devido lugar, fazendo a Itália entender que não está lidando com uma república das bananas, daquelas que se borram de medo das potências centrais e estão sempre prontas para acatar ultimatos velados.
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