ONU: Relatório sobre comércio e desenvolvimento é lançado

Nesta quinta-feira, 04 de setembro, às 15h, as Nações Unidas realizam uma coletiva de imprensa para o lançamento do Relatório sobre Comércio e Desenvolvimento 2008, publicado anualmente pela Conferência das Nações Unidas sobre Comércio e Desenvolvimento (UNCTAD). O Diretor do Escritório da Comissão Econômica para a América Latina e o Caribe (CEPAL) no Brasil, Renato Baumann, receberá a imprensa na sede da CEPAL, em Brasília.
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O Diretor do Escritório da Comissão Econômica para a América Latina e o Caribe (CEPAL) no Brasil, Renato Baumann, receberá a imprensa às 15h00 na sede da CEPAL, em Brasília (SBS - Edifício BNDES, 17º andar). Após apresentação do Relatório, ele estará disponível para responder a perguntas da imprensa. É solicitado confirmar presença nos telefones: (61) 3321-3232 ou (61) 3321-5494, ramais 716 ou 702. Informações adicionais pelo telefone (21) 2253-2211 ou email valeria@unicrio.org.br

Leia aqui a íntegra do relatório. Confira abaixo trechos do relatório.

Instabilidade atual e ameaça de oscilações especulativas apontam a necessidade de maior controle financeiro global

Relatório de Comércio e Desenvolvimento 2008 alerta que perspectivas sombrias para os países ricos podem se espalhar e interromper o recente 'boom' dos países em desenvolvimento caso os preços das 'commodities' declinem (UNCTAD/PRESS/PR/2008/023, original em inglês)


Genebra/Brasília – Incerteza e instabilidade nos mercados internacionais financeiros, monetários e de commodities, unidos às dúvidas sobre a direção da política monetária nos principais países em desenvolvimento, estão contribuindo para um futuro sombrio para a economia mundial e representam riscos consideráveis para os países do terceiro mundo, segundo o Relatório Anual de Comércio e Desenvolvimento(1) da UNCTAD.

O Relatório, conhecido como TDR 2008, tem como foco a situação dos países em desenvolvimento, que permanecem altamente vulneráveis às flutuações dos preços das mercadorias. Também ressalta o papel da especulação nas grandes alterações dos preços das commodities. O Relatório defende que tais especulações – que perseguem lucros em curto prazo em detrimento da estabilidade em longo prazo – e a crise em potencial, que viria com ajustes abruptos das taxas de câmbio e mudanças nas balanças comerciais nacionais, apontam para a necessidade de mecanismos racionais e tranqüilizadores para controlar os fluxos financeiros internacionais e os equilíbrios monetários.

Os economistas que redigiram o relatório dizem que a atual crise financeira global e a possibilidade de políticas monetárias rígidas em alguns países é um presságio de grandes dificuldades para a economia mundial no restante de 2008 e em 2009. A explosão de certas bolhas especulativas e a volatilidade dos preços das commodities representam desafios enormes para os responsáveis pela adoção de políticas, em particular das políticas monetárias. Uma depressão global tem que ser evitada ao mesmo tempo em que a inflação derivada do aumento dos preços dos alimentos e da energia ainda está muito alta. A situação pode se tornar ainda mais difícil se as moedas dos países com grandes contas correntes deficitárias forem pressionadas para a desvalorização.

O relatório, com subtítulo “Preços de Commodities, Fluxos de Capital e o Financiamento de Investimentos”, foi lançado hoje.

A UNCTAD prevê que a produção mundial cresça cerca de 3% em 2008: quase um ponto percentual a menos que em 2007. Em países desenvolvidos, o crescimento do Produto Interno Bruto provavelmente será de cerca de 1,5%. O resultado imediato é melhor para os países em desenvolvimento, onde o crescimento pode exceder 6%, como resultado de dinâmicas de demanda interna relativamente estáveis em grandes economias em desenvolvimento. Mas a recessão nos países desenvolvidos e as políticas monetárias excessivamente restritivas em países em desenvolvimento, com altas inflações nos preços de alimentos e energia podem levar a uma maior desaceleração do crescimento nestes.

Para um grande número de países em desenvolvimento o prognóstico depende primordialmente de tendências futuras dos preços dos bens primários que exportam. Diversos fatores estruturais justificam a expectativa de que os preços se mantenham em um nível mais alto do que nos últimos 20 anos. No entanto, fatores cíclicos, retirada de fundos especulativos e atrasos nas respostas da oferta bem podem trazer um significativo declínio. "Assim como a especulação intensificou o movimento ascendente dos preços, também pode intensificar um movimento de queda dos preços", diz o Secretário-Geral da UNCTAD, Supachai Panitchpakdi, na apresentação do relatório.

Os economistas da UNCTAD são severos em suas avaliações do sistema de controle financeiro mundial: "A recente crise mostrou mais uma vez que a disciplina do mercado é ineficaz quando se trata de prevenir episódios recorrentes de ‘exuberância irracional’, porque ”a atual base internacional para políticas monetárias e de câmbio oferece oportunidades para atividades especulativas que são altamente lucrativas por um período limitado de tempo, mas, em última instância, desestabiliza o sistema inteiro." Eles pedem, no relatório, que haja uma regulamentação mais prudente e firme para reduzir a volatilidade e os efeitos negativos sobre a renda e intervenções onerosas para os cofres públicos.

Entretanto, recentes passos tomados pelos principais bancos para prover liquidez às instituições financeiras afetadas pela atual crise são considerados apropriados, devido aos riscos sistêmicos para o sistema global financeiro sem essas ações. A UNCTAD teme que, apesar de alguns ajustes nas desigualdades das contas correntes ao redor do mundo, desencadeados pela queda do dólar, divergências em políticas monetárias incentivem renovadas especulações desestabilizadoras em mercados cambiais. O relatório pede uma intervenção coordenada entre todas as partes envolvidas neste caso. Também aponta que uma correção não recessiva das desigualdades globais requereria um estímulo mais forte aos gastos domésticos e às importações nas principais economias de saldo positivo, especialmente na Alemanha e no Japão, assim como uma apreciação moderada da moeda chinesa. Os economistas da UNCTAD vêem "uma grande probabilidade de um declínio prolongado e agudo da economia mundial" e lamentam que os responsáveis por criar as políticas econômicas sejam incapazes de lidar com esse desafio.

Por outro lado, acreditam que o risco de inflação galopante, como resultado dos maiores preços das commodities primárias, tem sido consideravelmente superestimado. A probabilidade de uma espiral dos salários ocorrer é muito menor hoje do que nos anos 70, quando o preço do petróleo aumentou. Isso é devido aos custos da unidade do trabalho, que são um fator determinante da inflação e que cresceram muito pouco na maioria dos países. "Medidas para tornar a política monetária mais restrita exacerbariam a recessão global", alerta o relatório.

O TDR 2008 sugere que a volatilidade recente dos preços das commodities não pode ser explicada sem levar em consideração o papel da especulação e estimula os governos a tomarem novas medidas, com o objetivo de atingir maior estabilidade dos preços das commodities. O relatório também recomenda instrumentos de resposta rápida para mitigar o impacto de grandes flutuações dos preços das commodities: "Medidas de regulamentação severas, que ajudem a conter a especulação nos mercados de commodities, seriam um passo importante, já que esta especulação tipicamente exacerba as tendências dos preços originadas de mudanças nos fundamentos."

Economistas da UNCTAD, lembrando um tema recorrente, aconselham que uma maior diversificação e desenvolvimento industrial são a melhor estratégia de longo prazo para reduzir a vulnerabilidade às oscilações dos preços das commodities. Esta transição requer maiores investimentos em novas capacidades produtivas – a habilidade de manufaturar bens mais variados e sofisticados – e em infra-estrutura. É mais fácil financiar estes investimentos em fases de “boom”, como a atual, observa o relatório. Mas, em vários países, grande parte dos lucros consideráveis advindos dos preços cada vez mais altos dos combustíveis fósseis e produtos de mineração é escoada para empresas estrangeiras. Isso significa que esses lucros ou se perdem como capital potencial para os países onde eles são originados ou, como freqüentemente acontece, são reinvestidos pelas empresas estrangeiras nas mesmas atividades de extração, perpetuando a dependência das commodities, ao invés de reduzi-la, afirma o relatório.

Fluxo de capital está indo de países pobres para ricos e desafiando o pensamento econômico convencional

Diversos países no hemisfério sul se tornaram exportadores líquidos de capital para o norte, mas a necessidade de maior ajuda pública permanece, diz Relatório sobre o Comércio e o Desenvolvimento 2008 (UNCTAD/PRESS/PR/2008/024, original em inglês)

Genebra/Brasília – Os países em desenvolvimento, onde os recursos financeiros são mais escassos, têm exportado mais capital do que recebido. Este enigma desafia as teorias econômicas mais comuns, mas, quando analisado, sugere uma nova e poderosa abordagem para o desenvolvimento financeiro, revela o Relatório sobre Comércio e Desenvolvimento 2008 (TDR) (1) da Conferência das Nações Unidas para o Comércio e Desenvolvimento (UNCTAD). O enigma é ainda mais intrigante porque muitos desses países exportadores de capital têm atingido taxas de investimento e crescimento mais altas do que aqueles com economia baseada no modelo econômico padrão das importações líquidas de capital, afirma o relatório.

O estudo questiona a base teórica tradicional e sugere uma nova abordagem para o financiamento do desenvolvimento, focada menos nas importações de capital e em aumentos da poupança familiar, e mais no financiamento de investimentos através do lucro de empresas e em crédito bancário doméstico. O relatório diz que, usando esta abordagem, países em desenvolvimento muitas vezes podem evitar a dependência de influxos de capital estrangeiro, ao aplicar políticas macroeconômicas e cambiais apropriadas. Um forte aumento na ajuda pública ao desenvolvimento nunca foi tão necessário para ajudar os países pobres e dependentes de commodities a alcançar os Objetivos de Desenvolvimento do Milênio (ODMs) definidos pelas Nações Unidas, observa o relatório.

Desde 2002, diversos países em desenvolvimento passaram por grandes melhoras em seus balanços de transações correntes. Isso é resultado não apenas da explosão de commodities, mas de taxas de cambio real favoráveis e de um rápido crescimento na produtividade, que impulsionou as exportações de manufaturados de alguns países.

Dos 113 países em desenvolvimento e economias em transição, 42 eram exportadores líquidos de capital em 2002-2006, e 60 deles viram melhoras em seus balanços de transações correntes neste período, em comparação com 1992-1996. "Melhoras nas transações correntes e alterações de déficit para superávit foram inicialmente conduzidas por amplas desvalorizações nas taxas de câmbio em economias de mercado emergentes exportadoras de manufaturas". "Na maior parte destes países, as melhoras nas transações correntes começaram após a crise financeira na Ásia e foram sustentadas quando governos e bancos centrais subseqüentemente buscaram manter taxas reais de câmbio competitivas". Como esta estratégia muitas vezes requer intervenções em mercados de câmbio estrangeiros, contribui para uma rápida acumulação de reservas em moeda estrangeira. Para a maioria dos países cujo desempenho comercial é determinado basicamente pela demanda mundial por commodities primárias, as melhoras nas transações correntes começaram em 2003, quando os preços do petróleo e de produtos de mineração começaram a subir.

"As políticas macroeconômicas e cambiais, que desempenharam o papel principal na melhora da posição de transações correntes em muitos países em desenvolvimento, marcam uma ruptura com as estratégias do passado", diz o Secretário-Geral da UNCTAD, Supachai Panitchpakdi, no resumo do relatório. O documento mostra que a supervalorização do câmbio tem sido o mais freqüente e "confiável" prenunciador de crises financeiras em países em desenvolvimento, nos últimos 15 anos, enquanto a desvalorização das taxas de câmbio a índices reais freqüentemente abriu caminho para melhoras nas transações correntes e um rápido crescimento. De qualquer maneira, para evitar que governos utilizem a manipulação de taxas cambiais para aumentar artificialmente a competitividade internacional de produtores domésticos, a UNCTAD continua a recomendar a criação de uma estrutura de regras internacionais para taxas cambiais e políticas financeiras, similar àquela que rege o comércio através da Organização Mundial do Comércio (OMC).

O fato de países em desenvolvimento, enquanto grupo, serem exportadores líquidos de capital, contrasta com as expectativas econômicas convencionais que afirmam que, com mercados financeiros abertos o capital irá fluir dos países ricos para os pobres, atraído por maiores taxas de lucro. Inicialmente, pode parecer surpreendente que quantias crescentes de capital estejam indo "de baixo para cima" de países pobres para ricos. É uma surpresa ainda maior o fato de que o investimento produtivo e o crescimento são, em média, maiores nos países em desenvolvimento, exportadores líquidos de capital, do que nos receptores líquidos de capital. Ou seja, maiores taxas de investimento para diversificação e mudanças estruturais nem sempre necessitam de um balanço de transações correntes em déficit, ou - o que é a mesma coisa - influxos líquidos de capital, conforme sugerido pelos modelos econômicos mais utilizados. De fato, diversos países em desenvolvimento, particularmente na América Latina, não conseguiram alcançar um alto investimento produtivo conforme reza a abordagem tradicional, porque as políticas monetárias e financeiras que atraíam ondas de influxos de capital também levavam a maiores custos domésticos para financiamentos e a uma valorização cambial. O relatório sugere que, ao invés disso, políticas monetárias e sistemas financeiros locais precisam oferecer ambientes favoráveis para financiamentos domésticos seguros e confiáveis de empresas privadas.

A abordagem do TDR 2008 contém outra divergência ainda mais fundamental com a teoria convencional: um aumento na poupança familiar - que é difícil ou até mesmo impossível em países em desenvolvimento, devido à baixa renda per capita - não é necessário para aumentar o investimento. A UNCTAD propõe uma abordagem alternativa na relação poupança-investimento, onde o financiamento depende principalmente das economias provenientes do lucro de corporações e do potencial do sistema bancário para criar financiamento de longo prazo.

Sob esta abordagem, os pré-requisitos para maiores investimentos não são a famílias "poupando mais" ou a disponibilidade de "poupanças externas", mas melhores condições de reinvestimento dos lucros das empresas e um papel ampliado da criação de crédito pelo setor bancário, em sua busca de financiar os investimentos de longo prazo.

O relatório também revela que, apesar de que cada vez mais países em desenvolvimento têm reduzido sua dependência de fluxos de capital estrangeiro e se tornaram exportadores líquidos de capital, os países mais pobres e dependentes de commodities, com estruturas de produção insuficientemente diversificadas, continuam a depender de influxos de capital estrangeiro para financiar importações de bens de produção essenciais. O estudo diz que para haver uma chance realista de se alcançar os Objetivos de Desenvolvimento do Milênio, que incluem reduzir à metade a extrema pobreza até 2015, a ajuda pública ao desenvolvimento precisaria ser aumentada entre 50 e 60 bilhões de dólares por ano acima dos níveis atuais.

Políticas monetárias e financeiras favoráveis a investimento são a chave para crescimento sustentado nos países em desenvolvimento, afirma relatório

Foco deve ser nos lucros retidos e na criação de crédito para investimentos pelo sistema bancário, recomenda Relatório de Comércio e Desenvolvimento (UNCTAD/PRESS/PR/2008/025, orignal em inglês)

Genebra/Brasília – Embora os preços elevados das commodities, vendidas no mercado internacional pelos países em desenvolvimento há bastante tempo, tenham ajudado bastante essas nações nos últimos anos, elas precisam continuar se concentrando na diversificação econômica e na industrialização sustentada, afirma o Relatório de Comércio e Desenvolvimento de 2008 (TDR) da UNCTAD (1). Uma das principais mensagens do documento é a necessidade de maiores investimentos nesses países, para criar uma nova “capacidade produtiva” - habilidade para fabricar produtos mais variados e sofisticados – e a idéia de que o financiamento para essas atividades pode vir cada vez mais de fontes domésticas, desde que os sistemas monetário e financeiro sejam projetados e encorajados a isso. Com o subtítulo de “Preços de Commodity, Fluxos de Capital e Financiamento de Investimentos”, o relatório foi divulgado hoje.

Para incentivar investimentos que acelerem tantas mudanças estruturais, os países em desenvolvimento não devem confiar apenas no aumento da poupança doméstica e no afluxo de capital estrangeiro. A política monetária nacional e os sistemas financeiros locais devem ser projetados de modo que empresas do setor privado tenham acesso confiável e acessível para investimentos que estimulem a capacidade produtiva, a eficiência e a diversificação.

Com este posicionamento, o relatório, conhecido como TDR 2008, desafia as teorias convencionais de desenvolvimento financeiro, que vêem os investimentos nos países em desenvolvimento como provenientes de poupanças provenientes principalmente da poupança familiar, e complementada pela importação de capitais (“poupança externa”). “Não são apenas os pressupostos desses modelos que estão longe da realidade, mas também suas previsões, que já foram repetidamente refutadas por evidências empíricas”. O documento sugere uma abordagem alternativa, baseada nos trabalhos de Schumpeter e Keynes e derivada de experiências do pós-guerra da Europa Ocidental e de desenvolvimento acelerado do Leste Asiático, onde o financiamento de investimentos produtivos foi baseado principalmente nos lucros retidos das empresas e na capacidade de criação de crédito dos sistemas bancários locais.

Entre as fontes domésticas de investimento, o autofinanciamento através dos lucros retidos é a mais importante e confiável, segundo o relatório. O crédito bancário é a segunda fonte mais importante de financiamento para empresas, especialmente para novos negócios e pequenas e médias companhias. “É de extrema importância que uma parte substancial dos ganhos das empresas seja reinvestida na capacidade produtiva”, considera o Secretário-Geral da UNCTAD, Supachai Panitchpakdi, no panorama geral do TDR 2008. O relatório sugere que investimentos financeiros poderão ser obtidos por meio de uma série de incentivos fiscais, como tratamento fiscal diferenciado para lucros retidos ou reinvestidos, ou incentivos especiais de depreciação.

O relatório enfatiza que o poder de criação de crédito dos sistemas bancários, baseado na liquidez promovida pelos bancos centrais, deve ser combinado a fortes arranjos institucionais e instrumentos de política adicionais para manter a estabilidade de preços. Em especial, o relatório solicita a criação de uma política de renda que previna aumentos excessivos dos salários nominais, além de uma política fiscal flexível. Esta tem sido uma receita de sucesso nos países recentemente industrializadas do Leste da Ásia (NIEs). Nesses países, as taxas de juros reais têm sido consideravelmente mais baixas do que na maior parte da América Latina e da África, onde a política monetária tendeu a se focar quase inteiramente em evitar a inflação. Isso deu origem a baixos níveis de investimento e crescimento lento.

Experiências em vários países demonstraram que políticas de taxas de juros altas – baseadas na premissa de que elevações anteriores nos níveis de poupança doméstica e de afluxo de capital estrangeiro são pré-requisitos para maiores investimentos – são contraproducentes. Os juros altos reduzem os lucros dos negócios por conta da menor demanda agregada e do elevado custo de financiamento, desacelerando o investimento doméstico e o crescimento dos lucros. De acordo com o TDR, esta é provavelmente a principal razão pela qual as reformas financeiras realizadas por muitos países em desenvolvimento e economias em transição, nas décadas de 1980 e 1990, falharam em aumentar os níveis de investimento. Ao invés de criarem um aumento sustentado dos empréstimos bancários com propósito de investimento a empresas privadas, a maioria dessas reformas levou a um boom de empréstimos para consumo e compras de imóveis resultando, geralmente, em crises bancárias e financeiras.

Encontram-se ainda em níveis excessivamente elevados, na maioria dos países em desenvolvimento, os diferenciais de juros entre, por um lado, a taxa básica do Banco Central e a taxa paga aos depósitos e, por outro, a taxa cobrada aos empréstimos. Nesses países, a maioria dos bancos comerciais considera mais rentável e menos arriscado expandir o crédito destinado ao consumo e à habitação, ou comprar títulos da dívida pública, do que promover empréstimos de longo prazo para projetos de investimento e novas atividades comerciais. O acesso ao crédito bancário ainda depende muito do tamanho da empresa, fazendo com que firmas novas, pequenas e inovadoras freqüentemente encontrem sérias dificuldades de financiamento, mesmo quando elas podem arcar com as elevadas taxas de juros reais dos empréstimos.

“Na perspectiva de financiar o desenvolvimento, não importa apenas o potencial de lucro microeconômico de um projeto mas, também, os benefícios externos que esse processo gera para a economia como um todo”, observa o TDR. Economistas da UNCTAD recomendam, portanto, que os governos influenciem de maneira mais forte o direcionamento do crédito para setores e atividades estratégicos. Isto pode levar, por exemplo, ao fornecimento direto de fundos por instituições financeiras públicas ou subsídios fiscais a projetos selecionados. Um controle mais rigoroso do crédito para fins de consumo ou especulativos também pode encorajar a alocação de crédito para projetos de investimento. Em instâncias onde taxas de juros elevadas refletem percepções de risco elevadas, as garantias do governo podem ser consideradas para empréstimos que financiem projetos de investimento promissores de empresas que, de outra maneira, podem ter acesso ilimitado, ou mesmo inexistente, a crédito bancário de longo prazo. Uma maneira de aproximar considerações comerciais e de desenvolvimento na alocação de crédito seria no financiamento conjunto, por bancos públicos e privados, de certos projetos de investimento. Isso uniria a experiência do setor privado na avaliação de viabilidade de projetos às considerações estratégicas das instituições públicas, cuja participação no financiamento também reduziria os riscos do banco privado envolvido.

UNCTAD pede maior ajuda ao desenvolvimento para apoiar metas contra a pobreza, investimento produtivo e sustentabilidade da dívida

Relatório sobre Comércio e Desenvolvimento 2008 destaca falhas de políticas de ajuda e medidas para atenuar dívida (UNCTAD/PRESS/PR/2008/026, original em inglês)

Genebra/Brasília – Diversos países em desenvolvimento realizaram significativos progressos econômicos nos últimos anos mas, para se alcançar os Objetivos de Desenvolvimento do Milênio (ODMs), que incluem reduzir à metade a extrema pobreza até 2015 - será necessário aumentar em ao menos 50 bilhões de dólares por ano a Ajuda Oficial ao Desenvolvimento (ODA, na sigla em inglês) para os países pobres, conclui o Relatório de Comércio e Desenvolvimento 2008 (TDR 2008) (1), publicado pela Conferência das Nações Unidas para o Comércio e Desenvolvimento (UNCTAD). Conhecido como TDR, o relatório também afirma que medidas para atenuar a dívida precisam ser somadas a outros tipos de ajuda.

O TDR 2008, publicado hoje, tem como subtítulo "Preços de Commodities, Fluxos de Capital e o Financiamento do Investimento". Ele afirma que em todos os anos do novo milênio os países em desenvolvimento, enquanto grupo, alcançaram superávit em suas contas correntes, devido a exportadores de manufaturados, que têm tido rápido crescimento, e a diversos exportadores de petróleo e de recursos minerais. Isso significa que, no coletivo, os países em desenvolvimento se tornaram exportadores líquidos de capital para o hemisfério norte.

O relatório saúda o desempenho de um grande número de países em desenvolvimento na redução de suas dívidas externas. Segundo o estudo, esta realização se deve parcialmente a melhores políticas macroeconômicas, a uma melhor administração das dívidas e ao cancelamento de algumas delas. É principalmente o resultado de um ambiente externo favorável, caracterizado por preços de commodities altos e baixas taxas de juros. O TDR afirma que "este cenário pode não durar para sempre" e recomenda que governos solidifiquem os recentes avanços relacionados à dívida e aos indicadores econômicos. Além disso, sugere a aceleração dos processos de investimento, de crescimento e de mudanças estruturais, bem como a manutenção sustentável da situação das dívidas. As chances de se conseguir essa sustentabilidade são consideradas maiores quando o financiamento de débitos é usado apenas para projetos com retornos superiores aos custos dos juros dos empréstimos. Empréstimos fixados em moeda estrangeira deveriam, em princípio, estar limitados a projetos que possam gerar, direta ou indiretamente, os valores necessários para pagar as dívidas. Conseqüentemente, a UNCTAD sugere que as estratégias para lidar com dívidas externas estejam relacionadas a renovados esforços para que se fortaleçam os sistemas financeiros domésticos. Elas também devem estar ligadas à macroeconomia e a políticas cambiais que busquem prevenir uma supervalorização do câmbio e déficits em contas correntes.

Apesar do progresso recente, muitos dos países em desenvolvimento continuam a depender de influxos de capital estrangeiros, não apenas para alcançar os ODMs, mas para aumentar os investimentos domésticos, a fim de alcançar um crescimento mais rápido, financiar os gastos sociais e realizar mudanças estruturais antes de 2015. A Ajuda Oficial ao Desenvolvimento permanece crítica, especialmente para economias pobres e dependentes de commodities que, em geral, contam com empréstimos e auxílio de doadores bi e multilaterais.

De acordo com o Consenso de Monterrey de 2002, a maior parte dos doadores bilaterais definiu metas ambiciosas para aumentar a ODA e sua contribuição para uma parceria global destinada a alcançar os ODMs. No entanto, apesar de "um substancial aumento nas despesas, a maior parte dos doadores não está fazendo o que deveria para cumprir seus compromissos com a ODA. Além disso, há uma considerável distância entre os fluxos atuais de Ajuda Oficial e o que estima-se ser necessário para implementar medidas para alcançar os ODMs", observa o Secretário-Geral da UNCTAD, Supachai Panitchpakdi, na apresentação do TDR.

O relatório também trata da questão de a efetividade da assistência ter recebido maior atenção nos últimos anos. A efetividade da ajuda em geral é vista como dependente dos procedimentos adotados para implementar o auxílio e a qualidade das instituições e políticas dos países auxiliados. O TDR é crítico em relação ao fato de que, em muitos casos, a ODA tenha se tornado condicionada a uma série de critérios de administração, apesar de existirem largas divergências sobre o que são instituições e políticas adequadas, e de que haja pouca evidência empírica que mostre que a maneira como a ODA é controlada tenha impactos causais em sua efetividade.

De acordo com o relatório, a efetividade da ajuda deveria ser medida em relação a objetivos claramente definidos. O TDR alerta que, com a Declaração do Milênio, os objetivos de desenvolvimento humano foram colocados em primeiro plano, às custas de outros objetivos voltados à promoção do crescimento econômico no longo prazo. “Crescimento e mudanças estruturais perderam importância como objetivos explícitos de políticas desenvolvimentistas em um ambiente político e intelectual que parece estar dominado pela aceitação implícita da idéia de que, em uma economia liberalizada e globalizada, o crescimento e as mudanças estruturais são gerados automaticamente por forças do mercado”, dizem especialistas da UNCTAD no estudo. Como conseqüência, a proporção de ODA gasta em saúde, educação e outros fins sociais cresceu substancialmente, à custa da porção de ajuda dedicada a melhorar a infra-estrutura econômica e fortalecer os setores produtivos. A UNCTAD considera a Ajuda Oficial para saúde, educação e outros fins sociais, essencial e justificada, embora note que uma redução sustentável da pobreza depende ainda mais de um rápido crescimento da renda e da criação de empregos. “A não ser que a ODA ajude a aumentar o crescimento, é pouco provável que vá efetivamente reduzir a pobreza em longo prazo além do ano estipulado de 2015”, o relatório informa.

Os economistas da UNCTAD também acreditam que a efetividade da ajuda possa ser elevada com a participação de investimentos financeiros domésticos como, por exemplo, através da criação ou fortalecimento de instituições que iriam canalizar a ODA em projetos de investimento públicos e privados, financiados com instituições financeiras domésticas. Isso poderia facilitar o acesso de potenciais investidores domésticos a financiamentos de longo prazo, reduzindo os riscos de crédito para bancos domésticos. Essa abordagem poderia também fortalecer o sistema de intermediação financeira doméstica. Além disso, a UNCTAD acredita que a efetividade da ajuda poderia ser aumentada de forma geral com o direcionamento das quantias adicionais de ODA para os países mais pobres, com maior dificuldade para iniciar processos de auto-sustentabilidade, investimento e crescimento.

O relatório conclui que a ODA deve ser aumentada não apenas entre 50 e 60 bilhões em relação aos níveis atuais para atender os ODMs até 2015 mas, também, que é preciso uma quantia consideravelmente maior para atender as necessidades financeiras decorrentes dos investimentos produtivos exigidos, para garantir que a redução da pobreza possa ser sustentada além daquela data. Novos desafios de parceria global para o desenvolvimento também crescem com a necessidade de adaptação às mudanças climáticas e de diminuir seus impactos nos países mais pobres.

(1) O Relatório de Comércio e Desenvolvimento 2008 (TDR2008) (Sales NoE.08.II.D21, ISBN 978-92-1-112752-2) pode ser obtido nos escritórios da ONU ou com os agentes de vendas da ONU em vários países. Preço: US$ 55; com preços especiais de US$ 27.50 em países em desenvolvimento, Sudeste Europeu e países do CEI; e US$ 13.75 nos países menos desenvolvidos.

Pedidos e perguntas para Europa, África e Oeste Asiático: United Nations Publication/Sales Section, Palais des Nations, CH-1211 Geneva 10, Switzerland, fax: +41 22 917 0027, e-mail: unpubli@un.org ; Américas e Leste Asiático: United Nations Publications, Two UN Plaza, DC2-853, New York, NY 10017, USA, tel: +1 212 963 8302 or +1 800 253 9646, fax: +1 212 963 3489, e-mail: publications@un.org . Internet: http://www.un.org/publications .


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