Sobre “analistas políticos” e “institutos de pesquisa”

Aplicados porta-vozes de pesquisas eleitorais, os denominados “analistas políticos” revelam-se mestres do ocultismo político, esotéricos senhores de artes misteriosas, guardiões de conhecimentos secretos sobre os destinos da Nação. Dispensam investigações sobre a consistência, a fidelidade dessas pesquisas altamente remuneradas. Leia carta de Guilherme Kress ao programa “Faixa Livre”, veiculado pela rádio Bandeirantes AM 1360. Leia mais clicando aqui.

Rio de Janeiro, 29 de setembro de 2008
Com cópia para faixa.livre@yahoo.com.br

Prezados Amigos do “Faixa Livre”,

Os denominados “analistas políticos”, presentes na imprensa escrita, e nos bastidores das rádios e das emissoras de televisão, são contumazes em atribuir absoluta fidedignidade às informações dos “institutos de pesquisa”, sem contudo acrescentarem maiores considerações. A partir dessas informações consolidadas em dados estatísticos - em números frios -, concluem, por exemplo, sobre o grau de aceitação pessoal do presidente da República e do seu governo, para, em exercício de futurologia política, deitar falação sobre o que consideram determinante influência presidencial nas eleições de 2010. Ousam até em considerar como “favas contadas” a eleição do candidato que vier a ser indicado por Lula.

De forma idêntica se comportam os mesmos intrépidos “analistas” diante das “preferências do eleitorado” por este ou aquele candidato ao mandato de prefeito, prognosticando, com base em dados alardeados em pesquisas encomendadas, sobre se haverá, ou não, 2º turno e, em havendo, quais serão os contendores!

Cabe, no entanto, indagar: É lícito a esses “analistas” alegar desconhecimento das particularidades de cada pesquisa?

Positivamente, não. Pelo menos a lei não permite que pesquisas eleitorais se tornem verdadeiras “caixas pretas”; ao contrário, determina precisamente que:
“As entidades e empresas que realizarem pesquisas de opinião pública relativas às eleições ou aos candidatos, para conhecimento público, são obrigadas, para cada pesquisa, a registrar, junto à Justiça Eleitoral, até cinco dias antes da divulgação, as seguintes informações:

I - quem contratou a pesquisa;
II - valor e origem dos recursos despendidos no trabalho;
III - metodologia e período de realização da pesquisa;
IV - plano amostral e ponderação quanto a sexo, idade, grau de instrução, nível econômico e área física de realização do trabalho, intervalo de confiança e margem de erro;
V - sistema interno de controle e verificação, conferência e fiscalização da coleta de dados e do trabalho de campo;
VI - questionário completo aplicado ou a ser aplicado;
VII - o nome de quem pagou pela realização do trabalho (de pesquisa).”(Lei 9504, art. 33)

Registre-se que a lei impõe pena pecuniária à divulgação de pesquisa sem o prévio registro daquelas informações e criminaliza a pesquisa fraudulenta.

Não obstante, esses “analistas”, em se tratando, por exemplo, de pesquisa sobre os índices de aprovação do governo federal, limitam-se a repetir que foram ouvidas “N” pessoas em “N” municípios. Quase nunca revelam quem contratou a pesquisa, muito menos o grau de interesse do contratante nos resultados da pesquisa. Ponto e basta!

Entretanto, para que pesquisas do gênero se tornem legalmente sustentáveis para os fins a que se destinam, esses e outros informes deveriam ser considerados e revelados, tais como:
  • Quais foram esses municípios e a que estados pertencem?
  • Em quantos deles seus habitantes, total ou parcialmente, são beneficiários do “Bolsa Família”?
  • Foram ouvidas apenas pessoas do povo, ou as pesquisas estenderam-se a áreas de influência das estâncias ruralistas, financeiras e do grande empresariado?
  • Manifestaram-se políticos e palacianos?
E, em se tratando de pesquisas sobre as próximas eleições municipais, outras tantas informações deveriam estar instruindo os dados apresentados, além da simples indicação do número de pessoas ouvidas. Seriam elas:
  • As consultas foram feitas apenas a transeuntes ou, se também em residências, em que regiões estão localizadas?
  • Em que regiões ou bairros residem os transeuntes consultados?
  • Houve manifestações por categoria profissional? Quais delas?
  • A pesquisa se estendeu a comunidades habitadas por nossos irmãos mais carentes? E naquelas onde, não raro, até a polícia tem dificuldade de entrar?
Em ambos os tipos de pesquisa, são essas apenas algumas questões básicas que deveriam ser consideradas pelos “analistas”, em sua tarefa de interpretar, para divulgação pública, informações que sejam claras, completas, precisas, verossímeis.

Entretanto, os ditos “analistas”, contrariando a lei e a ética, vêm, em regra, preferindo despir-se da importante condição de idôneos intérpretes de pesquisas políticas, para assumirem a postura de simples porta-vozes dos números secamente apresentados pelos “institutos de pesquisa”.

Aplicados porta-vozes de pesquisas eleitorais, revelam-se mestres do ocultismo político, esotéricos senhores de artes misteriosas, guardiões de conhecimentos secretos sobre os destinos da Nação. Dispensam investigações sobre a consistência, a fidelidade dessas pesquisas altamente remuneradas. Para a numerologia política que praticam, tais investigações são plenamente dispensáveis; são coisas reservadas para os míseros mortais. Nem mesmo a melhor das pitonisas - as mitológicas sacerdotisas de Apolo - seria capaz de tal prodígio em termos de previsão do futuro!

Ocorre que - pelo menos para nós, os míseros mortais -, pesquisa pressupõe, necessariamente, “indagação ou busca minuciosa para a averiguação da realidade” (“Dicionário de Termos de Marketing”, Atlas, 1996), isto é, deverá importar em rigorosa investigação do que se pretende apurar, em especial quando se referir a pesquisa sobre matéria política, quase sempre destinada a exercer ponderável e esclarecedora influência sobre o eleitorado.

Não sendo assim, ou melhor, não atendendo - como há anos vimos presenciando - aos requisitos mínimos de informação pública juridicamente tutelada, ditas “pesquisas” não poderão ser tidas senão como aliciamento de votos, autêntica manipulação eleitoral.

Registre-se que o “Faixa Livre” não vem se contentando com a análise fria dos números apresentados nas pesquisas; comporta-se com a devida seriedade ao questionar o que eles efetivamente representam. Enquanto isso, atentos ouvintes do Programa vem registrando sérias reservas quanto à fidelidade das pesquisas.

É importante porém que nos mantenhamos alertas no momento, quando eleições municipais se avizinham. Não nos deixemos seduzir por pesquisas - especialmente as de última hora -, viciadas pela falta de transparência, postas a serviço das artimanhas de candidatos ungidos pelas cúpulas tucanas, neo-tucanas e assemelhadas, mestres em dizer - ao som de tendenciosos “jingles” - o que o povo, de boa fé, quer ouvir sobre as crônicas deficiências da administração pública, e em prometer soluções, não raro mirabolantes, de mais que duvidoso cumprimento, se considerarmos o destino das promessas, programas e juramentos dos seus padrinhos, um dos quais vem de também notabilizar-se por misturar incompetência com truculência.

Saudações,
GUILHERME, DE SANTA TERESA.

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