A luta da indústria contra a livre troca de conhecimento

Ganância das grandes empresas por aumentar lucros exorbitantes tem novo capítulo em condenação incoerente na Suécia. Autores do “The Pirate Bay”, site que não hospeda nada, são condenados na Justiça (e na mídia). A BBC, que também manipulou informação, entrega o xis da questão: “os servidores do Pirate Bay não hospedam conteúdos de direitos autorais, mas sim links para arquivos de vídeo e música mantidos nos computadores de seus usuários”. Artigo de Gustavo Barreto (*), da redação. Leia mais.

Na foto da AP, Gottfrid Svartholm Warg (à esq.) e Peter Sunde no tribunal, antes do veredicto.

A agência AFP informou na última sexta-feira (17) que a justiça sueca condenou “quatro diretores do site The Pirate Bay”, uma das redes de compartilhamento de conteúdo do mundo, a um ano de prisão por “cumplicidade na violação dos direitos autorais”. Cabe recurso, que já foi pedido. A “cumplicidade, leia-se, é compartilhada com outros 22 milhões de usuários – diretamente responsáveis pela troca de conteúdo. Inexplicavelmente apenas 4 foram condenados (cabendo recurso, nota-se).

“Ao elaborar o site com (...) funções de busca bem desenvolvidas, fácil 'uploading' e possibilidades de armazenamento, e com um 'tracker' (rastreador) linkado ao site, os acusados estimularam crimes que os compartilhadores de arquivos (filesharers) cometeram”, informou o tribunal.

“Não se preocupem, nada vai mudar para o The Pirate Bay, nem para nós nem para o compartilhamento de arquivos”, escreveu Sunde na comunidade do site no Twitter, segundo agência de notícias sueca. “Como em todos os bons filmes, os heróis perdem no início, mas têm uma vitória épica no fim. Isto é a única coisa que Hollywood nos ensinou”, afirma um texto publicado na página do Pirate Bay.

Na imagem, marca do site "The Pirate Bay"

O tribunal condenou os réus ainda a pagar 30 milhões de coroas (3,56 milhões de dólares) por “danos e prejuízos à indústria fonográfica, cinematográfica e de jogos eletrônicos”, que pediam 117 milhões de coroas (US$ 13,9 milhões) a título de “lucros não obtidos provocados pelos downloads via internet”.

Conforme John Kennedy, representante da Federação da Indústria Fonográfica (IFPI, na sigla em inglês), que entrega sua própria hipocrisia, “esse pessoal não estava defendendo um princípio, eles estavam querendo encher os bolsos. Não havia nenhum mérito no comportamento deles”. Parece que lucrar vale para uns, mas não para outros. Kennedy e sua indústria ignoram não só o princípio do compartilhamento de arquivos quanto a nova realidade dos dados em nível global.

Caso se estenderá por “2 ou 3 anos”, afirmam criadores

Os quatro criadores do Pirate Bay confirmaram que já apelaram contra a decisão. Em postagem no blog oficial, os rapazes dizem que o caso já está num nível superior da corte e levará mais dois ou três anos para que uma nova sentença seja decretada. Os responsáveis pelo site de torrents pedem aos usuários que parem com as mobilizações para arrecadar o dinheiro da multa, pois ela não será paga.

A postagem [1] diz que, se os usuários quiserem ajudar, podem mandar mais torrents, comprar uma camiseta do The Pirate Bay, não ter medo de usar a rede e continuar criando blogs, grupos de discussão e sites de compartilhamento de arquivos.

A imprensa correu para “condenar” previamente os coordenadores do Pirate Bay, mesmo que ainda caiba recurso. “O dinheiro irá para várias empresas da indústria do entretenimento, como Warner Bros, Sony, EMI e Columbia Pictures”, escreveu a BBC Brasil, ignorando que nada será pago até que o recurso seja avaliado pela Justiça. “Nada vai acontecer com o TPB [sigla do site], isto foi apenas um grande teatro para a imprensa”, desdenhou Sunde.

Como funciona o compartilhamento de arquivos

Fundado em 2003, o Pirate Bay possibilita a troca de arquivos de filmes, músicas e jogos por meio da tecnologia de “bit torrent”, mas nenhum material baixado pode ser encontrado no servidor do Pirate Bay, que reúne em sua rede 22 milhões de usuários.

É uma contradição em termos técnicos condenar o site em si (e não o conjunto de 22 milhões de usuários), já que o Pirate Bay não existiria sem a intensa atividade do conjunto de usuários da rede. Conforme a própria BBC teve que admitir (só depois de confundir o leitor), “os servidores do Pirate Bay não hospedam conteúdos de direitos autorais, mas sim links para arquivos de vídeo e música mantidos nos computadores de seus usuários” [2].

Esta semana, a British Telecom, em decisão arbitrária, decidiu bloquear o Pirate Bay para usuários das redes móveis [3], seguindo determinação da entidade conservadora Internet Watch Foundation.

Referências

[1] Blog oficial do “The Pirate Bay”: http://thepiratebay.org/blog.php
[2] Fundadores do Pirate Bay são condenados à prisão na Suécia. BBC Brasil online, 17/04/2009. [http://www.bbc.co.uk/portuguese/ciencia/2009/04/090417_sueciapiratebayml.shtml]
[3] Ver notícia tendenciosa da Exame Informática, de Portugal [http://exameinformatica.clix.pt/noticias/internet/1002262.html]. Com esta decisão, o Pirate Bay foi colocado pela empresa no mesmo saco dos sites que contem conteúdo sexual explícito.

(*) Gustavo Barreto, editor da Revista Consciência.Net e integrante do Pontão de Cultura Digital da Escola de Comunicação da UFRJ.

2 comentários:

Anderson disse...

Neste caso, o que de fato é ilegal? Manter tais arquivos no computador? Como funciona então o Rapidshare, Megaupload e afins? Os usuários que baixam os programas via qualquer coisa é que são os criminosos perante a lei?
Independente da conclusão, porque ninguém avalia os benefícios deste compartilhamento mundial? Por acaso o mundo não seria melhor se não só arquivos mas tudo na vida fosse compartilhado?

Anônimo disse...

The Pirate Bay